Acho massa que o pôster principal de Succession inclua a turma sentada à mesa para uma refeição em família e creio ter encontrado no texto de John Berger, The eaters and the eaten (escrito em 1976), argumentos que dialogam com a genial onipresença da comida no roteiro de Succession. Seguem trechos pinçados do ensaio (*tradução e grifos são meus):
"Para a burguesia, o drama de comer, longe de ser repousante, é um estímulo. O convite teatral da cena frequentemente provoca dramas familiares nos momentos das refeições. O espaço do típico drama edipiano não é, por mais lógico que possa ser, o quarto; mas a mesa de jantar. A sala de jantar é o espaço de reunião onde a família burguesa aparece para si mesma em disfarce público, e onde os interesses conflitantes e as lutas pelo poder são perseguidos de maneira altamente formal. (...) A burguesia come em excesso. Especialmente carne. (...) Se a escala da refeição for espetacular, todos compartilham a conquista, e o tédio é menos provável. A conquista partilhada não é, fundamentalmente, a da culinária. A conquista é a da riqueza. (...) A variedade, a quantidade e o desperdício de comida comprovam a naturalidade da fortuna. (...) O jeito burguês de comer é centrado na fantasia, no ritual e no espetáculo: é centrífugo e cultural. (...) nunca está completo e dá espaço para um apetite que, essencialmente, é insaciável."
- John Berger, The eaters and the eaten (1976)
Foi a primeira vez que ouvi a expressão "a man with two assholes" e — que me perdoem os caros tradutores — estou convicta de que qualquer tentativa de tradução que implique eliminar o potente sentido imagético acoplado a ela estará fadada ao fracasso. Pera, se bem que o nosso "cuzão" chega super perto. Mas sim, essa cena e essa pergunta não saem da minha cabeça. Como será a sensação, né? Ser casada com um tonto que tem dois c*s? (hahahadlauragdshkadsjkdhiewr *help*)
Na moral, a performance do
Pera, pera; quer dizer que até o tamanho do guarda-chuva faz parte da competição entre os caras? Levarei um tempo para processar essa atualização. Pode parecer detalhe bobo, mas essa imagem do guarda-chuva traduz de modo sutil, perspicaz e cômico a filosofia da pirâmide social capitalista: com esse tamanho descabido de guarda-chuva, num espaço público por onde passariam seis pessoas, agora só passam dois fdp's.
**Bônus ⟶ Abaixo, outra imagem que aparece rapidinho no S02E10, como quem não quer nada, de ideia similar (porém bem menos sútil que a do guarda-chuva, é verdade); e que, além do mais, retoma a discussão acerca da comida que chega à mesa da galera:
💰💰💰💰
Livros não têm o mesmo protagonismo da comida, porém são igualmente bem aproveitados pelos roteiristas da série. Três pérolas: ➽1: por falar em cuzões:
➽ 2: pernalonga de batom® de esquerda tá na área:
💰💰💰💰💰
Ainda sobre livros: não sai da minha cabeça a possibilidade de estabelecer um paralelo entre Succession e a Tetralogia Napolitana, da Elena Ferrante. A escritora italiana aborda na série a forma como a pobreza é capaz de embrutecer as pessoas e as relações humanas (familiares, sobretudo), e Succession aparece para ressaltar que o excesso de dinheiro também pode produzir efeito correlato, ainda que se manifeste com características particulares.
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